terça-feira, 19 de abril de 2011

Papagaios à pesca do milho-voto


Na nossa galeria temos papagaios de muitas espécies, algumas vulgares, outras menos e outras ainda, pode dizer-se, raríssimas e de valor inestimável. O último que colocámos na moldura é um daqueles muito raros. De tal modo que o fomos encontrar abandonado no lixo da política. Um papagaio que já cacarejou o que tinha a cacarejar e que insiste em não fechar de vez o bico. Chegou a ocupar o poleiro da capital e imaginou que podia voar mais alto agarrado às asas do pai, mas acabou por se estatelar contra um muro, de resto, experiência pela qual, em tempos, já havia passado quando, num voo suicida sobre a floresta africana, ia acabando completamente depenado. E, felizmente, para os algarvios foi uma sorte que não tenha desaparecido entre as árvores, já que, sempre que se aproximam eleições, com o seu herdado ar cínico e bonacheirão, a fingir-se culto, simpático e amigo dos amigos e dos inimigos, aproveita para realçar o seu apego à passarada do sul, de quem, desinteressadamente, aguarda recolher algum do milho com que alimenta a esperança de não se apagar definitivamente do planeta.
E, aliás, como defendem alguns papagaios cor-de-rosa, é justíssima a sua escolha para representar a província à qual tantas ligações afectivas tem. Basta lembrar que a ave que chocou o ovo donde ele haveria de despontar é natural da Fuzeta. Também não é de menor importância o facto de a família ter um ninho bem situado na praia de João de Ourém, onde, ainda pequenino, ele gostava de molhar as patinhas na água salgada e onde, à babujem, em corridas palpitantes, já ia abrindo as asinhas, permitindo que adivinhássemos os sonhos que tinha com os altos voos, mas que, submetido ao peso da sombra do papagaio de todos os papagaios, nunca foi capaz de concretizar.
E é pena, porque o Jô era o papagaio ideal para elevar o Algarve à capital da cultura e para o fazer subir ao patamar mais alto do pódio dos centros pesqueiros do mundo. Não podemos esquecer como, há cerca de um ano, na véspera de umas eleições para o jardim zoológico europeu, num ou outro contacto com os media, alardeou o seu conhecimento profundo sobre a obra de Manuel Teixeira Gomes, um republicano que mereceria honras de uma justa homenagem a que ele, já com o milho-voto no papo, não ligou pevide. E não podemos esquecer, agora na antecâmara de mais uma caça ao dito milho-voto, o seu entusiasmo com a ideia de que os algarvios vão poder ficar na história quando, concertados com os japoneses, se dedicarem à pesca do atum, que já pouco passa pela nossa costa, e da cavala, que é um peixe com uma alta cotação no mercado, de tal maneira rentável que, quem sabe, possa vir a resolver o problema da dívida soberana e acabar com a doença crónica do deficit do zoo.

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