sexta-feira, 10 de junho de 2011

Sócas o papagaio filósofo


O Sócas, após ter sido corrido do poleiro, decidiu meditar sobre o que correu mal no seu desempenho como primeiro papagaio. Sentado à frente da máquina do tempo, olhou o buraco negro que deixou atrás de si, e, de início, não foi fácil perceber a razão da sua sentença de morte. Incrédulo e magoado com a condenação, mas convicto das suas virtudes, ao contrário do seu homónimo grego, optou por fugir para um convento, em Paris, tal como já haviam feito os seus antecessores - um para Bruxelas e o outro para os confins do mundo dos refugiados.

A maiêutica socrática, que tão bem tinha resultado durante anos, designadamente ao convencer a passarada a não ter dúvidas sobre os seus argumentos e as suas teorias de que era capaz de fazer de um jardim arruinado o paraíso, embateu na parede de uma democracia que nunca foi capaz de aceitar e que, de resto, sempre considerou uma hipocrisia aristocrática.

Sem nunca ter tirado um curso, a não ser o das novas oportunidades que a universidade independente vendeu a muitos cucos irresponsáveis, Sócas tomou a grande decisão da sua vida: regressar aos livros para estudar teologia e tentar descobrir as razões porque se tornou num sofista de retórica fácil; porque se recusou sempre a respeitar os preceitos morais, bem como as regras que determinam a justiça das relações políticas e sociais; porque guiou sempre, e apenas, o seu comportamento de acordo com as suas conveniências mais mesquinhas; e, finalmente, porque nunca foi capaz de entender que a sua própria ignorância só o podia conduzir até à dita sentença de morte.

Antes de partir, com uma lágrima marota no bico, ainda teve tempo de se despedir dos papagaios cor-de-rosa com um sentido “adoro-vos”, que é como quem diz: até ao meu regresso. Quanto à passarada, apesar de condoída com o seu afastamento voluntário, espera que estude muito; que no fim dos seus estudos vista o hábito e o capuz de franciscano e que, definitivamente, vá pregar para um zoo longínquo.

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